sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A dupla moral das armas químicas e as mãos que balançam o berço



O propalado acordo que bane armas químicas na Síria é um daqueles exercícios de cinismo que deveria envergonhar todos os governos que participam do processo. Se por um lado a necessidade de impedir que governos massacrem seus povos com armas químicas, também é igualmente óbvio que seria necessário impedir a transferência da tecnologia que está por detrás da sua fabricação. Como no caso da Síria, a tecnologia veio principalmente de ingleses e franceses,  a questão que clama por respostas é se esse dois impérios decadentes vão parar de fabricar armas químicas.



E aqui quero ainda chamar a atenção para o maior cinismo de  todos e exemplo da dupla moral. O fato é que o mundo hoje, e o Brasil em particular, vivem uma hecatombe química a partir do uso intensivo, abusivo e indiscriminado de agrotóxicos. Se formos examinar os bilhões de litros de compostos químicos que estão sendo aspergidos no mundo para supostamente controlar pragas e doenças, veremos que hoje somos bilhões de pessoas que vivem sob a ameaça de doenças gravíssimas que estão sendo ligadas diretamente ao uso dessas substâncias químicas.


Venho estudando há mais de uma década o uso de agrotóxicos por agricultores familiares e os datos que tenho encontrado e documentado são alarmantes. Vivemos uma espécie de guerra química não declarada, não contra os inimigos declarados que são invencíveis, mas contra agricultores e consumidores. E uma das coisas que eu vejo é que não temos ainda qualquer estratégia para documentar as evidências dessa guerra desproporcional contra a humanidade. 

Mas as evidências que surgem é que além dos problemas imediatos (como dermatoses, dores de cabeça, alergias, vômito) o uso de agrotóxicos está na raiz de doenças diversas e graves que incluem câncer, Mal de Alzheimer,  alterações genéticas, depressão. E o pior é que o sistema de saúde não está sequer preparado para estabelecer as ligações necessárias entre a guerra química dos agrotóxicos e essas doenças todas.

Há ainda que se lembrar que países como os EUA, Reino Unido, Alemanha e França sediam os principais fabricantes dos agrotóxicos que hoje inundam o mundo, contaminando nossos campos e mesas. Então que exemplo mais perfeito de dupla moral? Se quisessem mesmo ser sérios no combate às armas químicas, os governos desses países começariam por proibir o uso de agrotóxicos.