sábado, 15 de setembro de 2012

Mais uma pedra no caminho do Grupo X 


São João da Barra – A Associação dos Produtores Rurais do 5º Distrito sanjoanense (Asprim), representada por seus diretores, encaminhou ofício à 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva em Campos dos Goytacazes, no dia 12 de setembro, informando sobre a Lei nº 166/2010, aprovada pela Câmara Municipal de São João da Barra em 30 de dezembro de 2010, que poderá inviabilizar legalmente parte das obras do Complexo Logístico, Industrial e Portuário do Açu (CLIPA), implementado pela holding EBX do bilionário Eike Batista. 

O Artigo 1º da referida lei determina o tombamento, para fins de interesse social e ecológico, de um grande polígono na área do Açu devidamente georreferenciado. Já o Artigo 2º diz que a área tombada destina-se exclusivamente a atividades agropecuárias e à proteção dos ecossistemas abrangidos pelo polígono. 

O Artigo 2º ainda autoriza o Poder Executivo a adotar as providências orçamentárias e financeiras necessárias à execução da Lei, que também determina que a área mencionada “fica destinada exclusivamente para atividades ecológicas e agropecuárias e os proprietários atingidos pela área estabelecida deverão receber suporte técnico para o meio ambiente e para a atividade agrícola, bem como deverão ter o suporte de políticas sociais para fixação do homem no campo” 

Ainda de acordo com a Lei nº 166/2010, o objeto do tombamento “deverá receber proteção contra impactos sociais ou ambiental que venham a interferir na fauna, na flora e na produção sustentável dos proprietários inseridos nesta área”. 

De acordo com o vice-presidente da Asprim, Rodrigo Santos Silva, isto significa que a implantação do Complexo Logístico Industrial Portuário do Açu “afigura-se como empreendimento que agride diretamente os ditames da Lei”. 

Os signatários solicitam a instauração de Inquérito Civil Público “para investigar as agressões à Lei cometidas pelo Grupo EBX e pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, por ação do Instituto Estadual do Ambiente (INEA) e da Companhia de Desenvolvimento Industrial (Codin), bem como pela Prefeitura de São João da Barra”. Eles se comprometeram a acostar, o mais breve possível, mapa ilustrando toda a área tombada. 

A Lei nº 166/2010 foi aprovada quando a maioria dos nove vereadores do Poder Legislativo sanjoanense, então presidido pelo vereador Alexandre Rosa, era da bancada da oposição ao governo Carla Machado. No entanto, Rosa mudou de lado e hoje é o candidato a vice-prefeito da situação.


O susto no Ano Novo

Noêmia Magalhães, uma das líderes dos produtores rurais do 5º Distrito de São João da Barra que resistem às arbitrárias desapropriações efetuadas pela Codin – que, em seguida, repassa das terras para a LLX - lembra que no final de 2007 as notícias sobre desapropriações ainda eram uma idéia vaga: “Ninguém acreditava, o susto veio mesmo quando transformaram toda aquela área rural em distrito industrial na noite do dia 31 de dezembro de 2008 pela Câmara Municipal de São João da Barra. Naquele momento, a população estava mais envolvida nas comemorações do Ano Novo. Tudo aconteceu na calada da noite. Dias depois, fui informada pelos agricultores que todas as propriedades seriam desapropriadas”. 

Mas a reação surgiu no início do ano seguinte, quando parlamentares ligados às lutas sociais, como Paulo Ramos (PDT) e Marcelo Freixo (PSOL), organizaram audiências na Assembléia Legislativa para dar voz aos excluídos neste processo de desenvolvimento insustentável promovido pelo Estado do Rio de Janeiro. Em uma dessas audiências, Ramos colocou sua equipe de assessores à disposição do grupo para elaborar um projeto de lei a ser encaminhado ao Legislativo sanjoanense, determinando o tombamento da área, tão cobiçada pela Codin e pela EBX, para fins de interesse social e ecológico. 

Depois de acalorados debates entre situação e oposição, a Câmara Municipal de São João da Barra aprovou em outubro de 2010 o tombamento dos imóveis situados em terras do 5º Distrito. Com a medida, os vereadores pretenderam preservar a vocação rural da região e, ao mesmo tempo, tornar mais justo para os produtores o processo de implantação do complexo industrial. 

Na mesma época, os vereadores contestaram as medidas de compensação ambiental feitas pela LLX, pois de um total de R$ 4,5 milhões, foram investidos cerca de R$ 2,5 milhões em obras de drenagem que beneficiaram as próprias obras da holding. 

Os membros da Comissão de Defesa da Ecologia e Meio Ambiente da Casa, vereadores Carlos Machado Silva, Antônio Machado Mariano e Gérson Crispim (atual presidente) disseram, na época, que projetos voltados para os pescadores e produtores rurais, classes mais atingidas pelos empreendimentos, não estavam na lista de compensação ambiental. 

No entanto, devido às mudanças ocorridas na Câmara Municipal, incluindo a cooptação do vereador Alexandre Rosa para a bancada governista, a Lei aprovada e promulgada ficou engavetada na secretaria da Casa e só foi “ressuscitada” na primeira semana de agosto, graças à curiosidade de um diretor da Asprim, que ameaçou, inclusive, chamar a Polícia Federal se o projeto não aparecesse.

Esperança

Para os produtores rurais cujas terras já foram desapropriadas e outros que ainda sofrem ameaças da Codin e da holding EBX – há, inclusive, uma ação tramitando na Procuradoria da República em Campos dos Goytacazes sobre a presença de milícias armadas no ato das desapropriações -, está em curso um grande e obscuro processo de especulação imobiliária que beneficiará a holding em prejuízo de cerca de 1.500 famílias que produzem na região há várias décadas. 

Agora, com a nova denúncia ao Ministério Público Federal e Estadual, os produtores rurais renovam as esperanças: “Se a lei for cumprida e o tombamento se consolidar, os produtores rurais podem ficar mais tranqüilos”, diz Noêmia, entendendo que neste caso o meio ambiente terá que ser preservado, mesmo se alguma terra for vendida. “Sempre lutamos para preservar o que temos, seja a produção ou a natureza”, acrescenta. 

Fonte: Martinho Santafé (O Debate)