quarta-feira, 29 de junho de 2011

Remessa de lucro para o exterior sobe 24,8% nos cinco primeiros meses de 2011

29/06/2011- INFORMA CUT nacional

Projeção do BC para o ano é de colossais US$ 78 bilhões - 3,5% do PIB

por: Carlos Lopes/HP




Um quadro da economia nos primeiros cinco meses do ano parece, ao homem comum (que não teve o cérebro lavado com os despejos da oligarquia financeira), com o som de sirenes aos passageiros de um navio.

1) Segundo o balanço de pagamentos, divulgado na segunda-feira pelo BC, as remessas totais para o exterior (sobretudo de lucros das filiais de multinacionais, embora não apenas), nos cinco primeiros meses, aumentaram de US$ 25,6 bilhões (2010) para US$ 32 bilhões – um aumento de 24,8%. A projeção do BC são colossais US$ 78 bilhões (3,5% do PIB) até dezembro. Porém, mantido o ritmo atual, elas iriam para mais de US$ 87 bilhões (3,9% do PIB).

2) As importações aumentaram de US$ 66,5 bilhões (2010) para US$ 86 bilhões nesses cinco meses - um aumento de 30%. É quase um trabalho de jegue (ou de Sísifo, para os aficionados à mitologia) que tenhamos exportado US$ 96,6 bilhões para obter um saldo comercial de apenas US$ 8,5 bilhões. Com o câmbio viciado a favor do dólar, continuou a invasão das importações. O BC, que quer deixar o câmbio – uma consequência dos juros altos – como está, projeta, até o final do ano, um saldo de apenas US$ 15 bilhões, se exportarmos US$ 221,2 bilhões.

3) Os bancos e outras companhias, com a diferença de juros em relação ao exterior, aumentaram a dívida externa – com os “empréstimos intercompanhias”, ela atingiu US$ 389.438.623.098 em maio. Nada menos do que 84,8% dessa dívida é em dólar. A parte governamental é US$ 102,9 bilhões. Nem vamos falar do que pode acontecer com um aumento de juros nos EUA, porque não queremos passar pelo que um prócer da ditadura chamava de “cassandras agourentas” (o sujeito esqueceu-se que, em Troia, Cassandra estava com a razão).

Mas jamais existiu situação em que, depois de endividar os países da periferia, os bancos dos EUA não aumentassem os juros. Naturalmente, essa dívida é muito menor que a interna (R$ 1,75 trilhão, ao todo R$ 2,45 trilhões, se contarmos os “títulos em poder do BC”, utilizados nas “operações compromissadas” com os bancos). Porém, boa parte, talvez a maior parte da dívida interna é, a rigor, externa – ou seja, com bancos e especuladores estrangeiros.

4) Com o resultado de maio, o déficit externo (nas transações correntes ou em conta-corrente – a conta de curto prazo entre remessas e o que entrou, antes de tudo, pelo comércio exterior) foi para US$ 22 bilhões. A projeção do BC é um aumento de US$ 47,5 bilhões (2010) para US$ 60 bilhões este ano. Esse número é um motivo de alarme, pois representa, literalmente, a insustentabilidade – devido às remessas e às importações - das contas externas. Como, então, o sr. Mantega e a diretoria do BC permanecem tão tranquilos diante de um desastre total e consumado? 

Essa projeção de um déficit de US$ 60 bilhões é uma hipótese que considera exportações de US$ 221,2 bilhões. Depois de vender no exterior, numa conjuntura de crise externa, o equivalente a quase 10% do PIB, teríamos um rombo de 2,6% desse mesmo PIB. Ou, mais exatamente: para ter um buraco de 2,6% do PIB, teríamos de vender, em meio ao afundamento dos países centrais, 10% do PIB no comércio exterior.

Como as autoridades econômicas podem achar que essa situação não demanda medidas urgentes – a substituição das importações pela produção nacional, o fim do subsídio cambial (a hipervalorização do real, como consequência da invasão de dólares atraídos pelos juros de pesadelo) a essas importações, a queda imediata dos juros, o estímulo à produção voltada para o mercado interno através dos investimentos públicos, etc.?

A resposta a esta pergunta é desagradável para quem, como nós, apoia o atual governo, mas, por isso mesmo, se queremos que a presidente Dilma seja bem sucedida, temos que ajudá-la, ao invés de enganar a nós mesmos: as autoridades econômicas acham que vender o país, e não apenas a sua produção no exterior, é a solução.

Está na apresentação do Relatório de Inflação do BC:“para 2011, o crescimento do DCC [déficit em conta-corrente]continuará a ser financiado essencialmente por investimento direto estrangeiro” e nas declarações do sr. Mantega de que o “investimento direto” (a compra de empresas nacionais por empresas estrangeiras) nos “financiará” - como, desde 2006, ele afirmava que o “investimento direto estrangeiro” era a mola do crescimento, sem base alguma na realidade para confirmá-lo, muito ao contrário.

Para quem é suficientemente tolo para achar que vender o país é solução para o país (e não para os compradores), quando as remessas e importações aumentam, basta vender mais uma parte. Com isso, o estoque de “investimento direto estrangeiro” já estava, ao fim do ano passado, em US$ 400 bilhões. Sem que nenhum problema tenha se resolvido por isso – e vários tenham se agravado.

Infelizmente, como mostram as dificuldades na área do etanol, essa política é suicida - já havia assim se mostrado ao tempo da dupla Gustavo Franco/Fernando Henrique.

O motivo é que o “financiamento” do rombo externo com a venda do país tem como consequência, precisamente, o aumento das remessas para o exterior e das importações – isto é, o aumento do rombo externo. Cada empresa desnacionalizada é uma empresa que passa a remeter dólares e a aumentar importações de componentes (os “bens intermediários”, maior parcela dos importados), aproveitando-se de um câmbio manipulado para favorecer, entre outras coisas, as importações e as remessas.

Portanto, essa solução é um pouco pior que a do Barão de Münchausen para sair do atoleiro, puxando a si próprio pelos cabelos. Münchausen não teve a ideia de afundar-se mais no atoleiro para sair dele. Deixou essa inovação para o sr. Mantega.

Nos deteremos rapidamente no fato da atual vaga de “investimento direto estrangeiro” ser uma fraude, visível a olho nu, que todos comentam abertamente, sem que a Fazenda ou o BC tomem providência alguma: nesse frenesi especulativo, as entradas de capital especulativo (“investimentos estrangeiros em carteira”), nos cinco primeiros meses, caiu de US$ 20,2 bilhões (2010) para US$ 12,1 bilhões (2011) e o “investimento direto” subiu de US$ 11,5 bilhões (2010) para US$ 26,9 bilhões (2011).

É óbvio que essa inversão significa que o IOF do sr. Mantega está sendo trapaceado pelo registro de capital meramente especulativo como se fosse “investimento direto”. A seriedade da medida de Mantega é tanta que ele não se importa com isso. Afinal, é tudo encenação... Enquanto isso, o estoque total de capital especulativo estrangeiro dentro do país, em março, já estava em US$ 608 bilhões (v. levantamento do “economista-senior” da Nomura Securities, Valor Econômico, 16/03/2011).

Um amigo, aqui na redação do HP, costuma dizer que o problema do Brasil é o excesso de dinheiro.

Com efeito, depois de ouvir por décadas a idiotice de que o Brasil tem “baixa poupança interna”, portanto é imprescindível o capital externo, chegamos à situação em que o país paga ao capital externo para ser pilhado.

No ano passado, 10% do valor desembolsado pelo BNDES foi para as multinacionais automobilísticas (v. Monitor Mercantil, 09/06/2011). Somente em juros, nos últimos 12 meses, o governo pagou R$ 195 bilhões aos bancos, devido a uma taxa que o próprio governo pode determinar, através do BC. Permitiu-se o envio de US$ 80 bilhões para fora. Em cinco meses, pagamos (não há dúvida de onde sai esse dinheiro) US$ 86 bilhões por mercadorias importadas que poderíamos fabricar aqui.

No estudo da Nomura Securities existe outro número interessante: o estoque total de “investimento estrangeiro” no país, sob suas várias formas, era, em março, US$ 1,205 trilhão, sobre os quais o Brasil pagava um retorno de 16,5% ao ano.

Realmente, riqueza é o que não falta ao país. Nem ladrões de outras plagas - e equipes econômicas absolutamente acapachadas.